Análise Qualitativa do Livro ‘O Protecionismo Agrícola nos Estados Unidos: Resiliência e Economia Política dos Complexos Agroindustriais’ de Thiago Lima

Postado por: Fernando Farias

Autor da análise qualitativa: Doutor Fernando Rodrigo Farias, Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, Campus de Aquidauana.

O livro de Thiago Lima[1] que é professor do departamento de relações internacionais e do programa de pós-graduação em gestão pública da universidade federal de Pernambuco, representa uma análise científica importante que nos possibilita entender de maneira abrangente a dinâmica geral de como funciona a política de proteção a agricultura (subsídio) que o país mais rico do mundo (EUA) adota a muito tempo.

É importante ressaltar que o resultado desta pesquisa não é fator imediato, o livro é fruto de uma longa trajetória acadêmica que iniciou ainda na sua graduação em relações internacionais e mestrado também na mesma área e principalmente no seu doutorado na Unicamp. A pesquisa é fruto de financiamento em forma de bolsa tanto da FAPESP e do IPEA. É importante ressaltar que além do tema relevante que trata de temas como agricultura, financeirização e complexos agroindustriais, o livro recebeu prêmio de melhor tese na área de ciências política e relações internacionais no ano de 2015.

O objetivo da publicação em formato de nota qualitativa em forma de análise de publicação (livro) na página do Observa-geo (https://obgeo.ufms.br/) vai além de um esforço intelectual de análise de livros de temas vinculados ao perfil do observatório. Objetiva também estimular alunos da graduação, pós-graduação, professores, pesquisadores e outras pessoas interessadas no tema a lerem a nota e talvez o livro original na íntegra para tirar suas próprias conclusões.

A nota qualitativa de livros analisados, possui sempre a preocupação em se manter fiel as ideias originais do autor com pitadas de análise quando se entender como necessário a inclusão e vinculação de outras obras e textos que convergem ou complementem o conteúdo da análise a exemplo de temas como: financiamento agrícola, protecionismo agrícola, complexos agroindustriais.

A metodologia utilizada para esta análise qualitativa foi realizada por meio de uma leitura do livro, seguida de anotações dos principais detalhes do livro, focando na identificação dos principais pontos e na avaliação da organização textual. A metodologia incluiu a definição dos temas centrais abordados pelo autor e a análise dos principais pontos definidos como importantes.

Principais Pontos da Análise são:

  1. Protecionismo e Complexos Agroindustriais (CAIs): O livro explora como o protecionismo agrícola nos EUA está profundamente integrado aos CAIs, que incluem a agricultura, a indústria de máquinas e insumos, e a indústria processadora de matérias-primas.
  2. Impacto dos Subsídios: O autor discute a maneira como os subsídios priorizam fazendas que utilizam altos índices de insumos e tecnologias, levando a uma especialização na produção e à redução do número de culturas nas fazendas.
  3. Beneficiários dos Subsídios: Há uma análise de quem realmente se beneficia dos subsídios, mostrando que, apesar de a agricultura representar uma pequena parte do PIB, os principais beneficiados são os setores a jusante da produção primária, como a indústria processadora de alimentos.
  4. Efeito Econômico: O autor aponta que a queda nos preços das commodities, especialmente no setor de grãos, resulta em uma ‘falsa baixa nos custos’, criando um subsídio artificial que beneficia fortemente a indústria processadora de alimentos e os fornecedores de insumos agrícolas.

Em nossa visão a análise contida no livro de Thiago Lima oferece uma visão abrangente com muitos detalhes da política dos subsídios agrícolas e dos CAIs. A organização textual é clara e facilita a compreensão dos argumentos apresentados.

No entanto, o livro do professor Thiago Lima possui 191 páginas já com as referências bibliográficas. Possui 6 capítulos no qual se inicia tratando das principais teses e razões que os Estados Unidos adotam e mantem a política de protecionismo agrícola e vai até capítulos que mostram o funcionamento da dinâmica dos complexos agroindustriais nos EUA, política do regime alimentar internacional, sistema multilateral de comércio. O livro termina com uma análise dos principais elementos do funcionamento do subsídio agrícola no século XXI. Traz também um capítulo que analisa a cultura do amendoim nos EUA que por sinal foi tema de sua dissertação de mestrado.

O autor inicia o texto do livro citando o fato de que a política de subsídios de commodities nos Estados Unidos foram criadas ainda na década de 1930 “em meio ao movimento do New Deal” no qual foi criado naquele momento para lidar com os efeitos negativos da crise de 1929. Passaram-se alguns anos e a política do subsídio passou a ser uma estratégia “estrutural” e não apenas uma medida “anticíclica” como foi no seu início.

Apesar de os Estados Unidos serem amplamente conhecidos pela política dos subsídios da agricultura, “valor monetário anual das transferências brutas de consumidores e contribuintes para os produtores agrícolas”, não estão entre as nações que mais subsidiam em percentuais do custo de produção da agricultura. Conforme Lima (2018), entre os anos 2009-2011, em percentuais do custo os Estados Unidos se encontram em 11º lugar ficando atrás de países como (1º) Noruega que subsidia em torno de 60%, (2º) Suíça que subsidia em torno de 59%, (3º) Japão 52%, Coreia do Sul 51% do custo de produção. Acontece que como afirma o autor o volume da produção americana é gigantesco o que acaba gerando um enorme impacto inclusive capaz de influenciar a dinâmica agrícola no resto do mundo.[2]

No ranking dos programas de subsídios agrícolas dos Estados Unidos entre 1995 a 2012 (tabela 2,1 p, 51) mostra que do total de US$ 278.793.745.553 subsidiados a cultura do milho utilizou US$ 84.427.099.356 (30,2% do total), e beneficiou 1.641.615 beneficiários (16,14% dos beneficiários). Em seguida vem a cultura do trigo (12,73% do total subsidiado), programa de conservação de solo aparece em 4º lugar com 11,3% do total sendo a soja em 5º lugar com 9,98% do volume subsidiado.

Os dados mostram que as culturas mais subsidiadas estão ligadas àquelas ligadas a dinâmica de consumo de produtos da indústria processadora e indústria de alimentos processados, entre 1995 a 2012 do total de US$ 292 bilhões pagos pelo governo americano, US$ 177,6 bilhões (60,82%), foram para a produção das grandes commodities.

O autor mostra também que o subsídio da agricultura americana apresenta um caráter altamente concentrador havendo uma “distribuição dos subsídios bastante desequilibrada, aproximadamente 60% das fazendas americanas não recebem subsídios e 10% das fazendas que recebem subvenções ficam com 75% do total desembolsado pelo governo” (Lima 2018.p, 52).

Um termo importante utilizado pelo autor para descrever a política de subsídios é a capacidade de manter os produtos agrícolas ‘artificialmente competitivos’. O histórico dos subsídios mostra que se trata de uma estratégia estrutural, mantida independentemente da viabilidade econômica. Uma das questões levantadas pelo autor é como entender o fato de que, apesar de o setor agrícola americano representar uma pequena parcela do PIB e gerar poucos empregos em comparação com os setores industrial e de serviços, ele consegue mobilizar um grande esforço do Estado para sustentar o setor de subsídios.

No entanto, o autor destaca ao longo dos capítulos que é fundamental analisar o processo como um todo e não apenas o setor isoladamente. Embora a agricultura possa representar uma parcela menor de empregos e PIB em comparação com outros setores, é importante considerar quais setores da indústria e serviços existem em função do setor agrícola. Muitos desses setores dependem da agricultura para sua própria existência e funcionamento.

Entretanto, o autor responde a essa questão destacando que o processo está diluído em diversos setores correlacionados. É necessário analisar o processo em sua totalidade. Embora o setor agrícola, por si só, não apresente uma viabilidade econômica que justifique o nível de protecionismo agrícola nos EUA, o autor mostra que a concessão de juros mais baratos (como forma de subsídio) estimula uma cadeia complexa. Esta cadeia inclui desde a venda de produtos utilizados pelo agronegócio americano, passando pelo setor de beneficiamento, até os fornecedores de produtos agropecuários de diversas naturezas. O efeito desse processo é o aumento da produção e a consequente diminuição dos preços para os consumidores.

De acordo com Lima (2018, pp. 62-73), a estrutura do protecionismo agrícola dos Estados Unidos está majoritariamente integrada ao complexo agroindustrial (CAI), que abrange a agricultura, a indústria de máquinas e insumos, e a indústria processadora de matérias-primas. O autor observa que, nos EUA, as culturas que não utilizam grandes quantidades de agroquímicos recebem menos incentivo estatal.

Um ponto interessante surge nas páginas 72-73, onde o autor argumenta sobre quem realmente se beneficia dos altos índices de subsídios agrícolas nos Estados Unidos. Após uma análise mais detalhada, fica evidente que, apesar de ser um sistema que impõe determinações de taxa de lucro ao setor de ‘rendimentos decrescentes’, os principais beneficiados não são os agricultores, mas sim os setores a jusante da produção primária.

A queda nos preços das commodities, especialmente no setor de grãos das grandes commodities altamente subsidiadas, resulta, nas palavras do autor, em uma ‘falsa baixa nos custos’, criando um subsídio artificial que beneficia fortemente a indústria processadora de alimentos e os fornecedores de insumos agrícolas. Alguns fatores inerentes à dinâmica de desenvolvimento dos Complexos Agroindustriais (CAIs) americanos tornam-se claros ao longo do Capítulo III, quando o autor analisa esses CAIs:

  • Houve um aumento significativo na produtividade das fazendas devido ao avanço técnico e científico, que foi impulsionado principalmente pelo uso intensivo de novos insumos e técnicas avançadas. Além disso, houve uma melhoria na infraestrutura das fazendas, integrando o campo às redes de consumo.
  • Como os subsídios priorizam as fazendas com alto índice de consumo de insumos e tecnologias, forçando as fazendas a aumentarem a produtividade com lucros negativos e aumento constante dos custos de produção, houve a especialização da produção diminuindo drasticamente os números de culturas ou atividades nas fazendas. O autor monstra no gráfico 3,2 (p, 70) que a média de 5 commodities cultivadas nas fazendas perdurou entre 1900 e 1945, sendo que a partir de 2002 a média de commodities cultivada por fazenda se reduziu para 1 cultura.
  • Tendência a aumento do rendimento médio das commodities. Se em 1945 o rendimento do milho era de 36,1 bushel/acre em 2001/2005 saltou para 143,4. A soja foi uma cultura que não apresentou aumento substancial, ou seja, em 1945 era de 19,6 bushel/acre em 2001/2005 era de 39,4 bushel/acre.

Se por um lado houve aumento da produtividade beneficiando fortemente as redes de Fast-food que possuem um papel central neste modelo de agricultura, houve/há sérios problemas de endividamento dos agricultores americanos que foram forçados a investirem fortemente em insumos e novas tecnologias e em reduzido número de comodities na tentativa de ganhos por escalas.

O autor mostra que os grandes beneficiados não são os agricultores americanos. “o preço nominal do frango permaneceu virtualmente o mesmo num período de 50 anos”, ou seja, em 1948 o preço do frango vivo saia por 36 centavos de libras e em 2011 valia 39,3 centavos de libras. No entanto, a produção de frango subiu de 1,1bilhão de libras em 1945 para 42,4 bilhões de libras em 2001. Sendo que os preços agrícolas em geral aumentaram 15% entre 1980 a 2008, já o preço ao consumidor cresceram 122% no mesmo período.

Já o custo de produção em valor bruto aumentou significativamente. O autor cita importantes relatório de custos dos Estados Unidos (p, 77), onde aponta que o valor bruto obtido com a venda da produção da cultura do milho entre 1997 a 2005 ficou em 23% abaixo do seu custo de produção. Mesmo caso para a soja que ficou 15% abaixo do seu custo de produção.

Segundo Lima (2018.p, 100), citando Lauck (1996), o fator concentração dos grandes monopólios do setor do agronegócio contribuiu para que essa dinâmica de “puxar os lucros a jusante para longe do agricultor” sendo que os lucros se direcionaram tanto em direção a indústria de alimentos altamente processados para consumo da classe média americana quanto para a montante da indústria tecnológica. Se em 1920 eram 35 empresas que concentravam o setor de exportação de grãos, 50 anos depois este número diminuiu para 6 empresas. Essas 6 empresas 50 anos depois passaram a exportar 80% do sorgo, 90% da aveia, 95% do milho e 96% do trigo.

Esta dinâmica acelerou principalmente a partir de 1970 quando segundo o autor o crescimento de novas tecnologias passou a ocupar uma fatia maior e de crescimento muito mais rápido que a renda do agricultor americano. Os setores de fornecimento de insumos e equipamentos estão altamente financeirizadas operando nas bolsas de valores.

A dinâmica dos CAIS e a política dos subsídios alterou o processo de uso da terra para a agricultura americana. Segundo Lima (2018.p, 109), em 2000, em torno de 60% das terras que receberam subsídios eram terras arrendadas, ou seja, o proprietário não é produtor, as terras são exploradas por grandes magnatas.

Nesse contexto, há vários elementos relacionados à questão da terra nos Estados Unidos que, de acordo com Lima (2018), estão vinculados à política de subsídios. Essa política, por sua natureza, tende a estimular a necessidade de expandir continuamente a escala de produção, como forma de lidar com o aumento significativo dos custos de produção. Esses elementos são:

  • Aumento da concentração da propriedade fundiária prejudicando a agricultura familiar americana que não consegue lidar com a dinâmica do uso intensivo de tecnologias e aumento dos custos. Segundo Lima (2018), citando Cochrane (2003), a dinâmica de concentração da terra nos Estados Unidos, acabou sufocando a agricultura familiar americana, afinal, o modelo de agricultura vinculada aos CAIS tem como características a constante corrida para adotar tecnologias, além da aquisição de grandes tratores impossibilitando os pequenos agricultores com limitações financeiras para este tipo de investimento. Sendo assim, forçando os grandes fazendeiros a aquirir mais terras. O autor trás dados sobre o tamanho médio das fazendas em acre entre 1910 e 2000. Segundo dados do gráfico 4.4 (p, 116), se m 1950 a média das fazendas era de 200 acres em 200 ultrapassou os 450 acres. Mesmo caso para o número de fazendas, ou seja, se por volta de 1930 havia quase 7.000 fazendas, em 1990 este número caiu para pouco mais de 2000 fazendas.
  • O autor traz uma discussão sobre a proletarização das fazendas. Ou seja, a estrutura da cadeia produtiva americana, faz com que os agricultores americanos adotem uma “feroz corrida pela adoção e novas tecnologias de aumento de produção que gerarão um aumento as dívidas”. É importante ressaltar como já citado na presente nota que o cultivo das grandes commodities como soja, milho, trigo o custo de produção é entre 15 e 30% maior que o valor adquirido com a venda dos produtos no mercado, necessitando de grandes aportes financeiros do estado em forma de subsídios para a manutenção do funcionamento do complexo agroindustrial americano, que rompeu com a dinâmica de décadas passadas onde se pregava que o ideal seria “cada fazenda uma fábrica” passando a aprofundar a dependência dos agricultores aos fornecedores. Pelo fato também de os grandes beneficiários da política de subsídios serem o complexo a jusante da agricultura (fornecedores de insumos, indústria de alimentos, produção de máquinas e equipamentos e de outras tecnologias) e não os agricultores abre espaço para esta argumentação em relação ao fato de se seria possível aproximar essa interrogação.

O penúltimo capítulo do livro o autor faz uma análise do sistema do regime internacional e um multilateral do comércio vinculando os efeitos da política de subsídio mundial no mundo. Mostra por exemplo o forte poder político em que as políticas agrícolas no mundo tendem a privilegiar os Estados Unidos e grupos de países desenvolvido sendo assim prejudicando os países fora do centro dinâmico mundial. A política de subsídio americana é alvo de críticas no mundo todo, que amenta a oferta de commodities no mercado e rebaixa a economia dos preços prejudicando países sem grande capacidade industrial, afinal, as fazendas americanas operam em regime deficitário, mas, com os subsídios acaba mantendo os negócios que privilegia uma série de segmentos dos complexos agroindustriais.

De acordo com Lima (2018.p,130), os Estados Unidos sustentam o argumento de que os subsídios são fundamentais também para o acesso aos mercados estrangeiros portanto havendo uma vantagem externa também. No entanto, a política dos subsídios “colocam as commodities numa posição artificialmente vantajosa, o que acaba gerando emulação e contestação internacional”.

Estamos falando, assim, de relações de poder nas quais os Estados utilizam seus recursos estatais para favorecer seus interesses econômicos. Para os Estados Unidos, particularmente, esse movimento os torna capazes de exportar os custos dos ajustes internos, dado que os CAI não necessariamente precisam funcionar de forma como funcionam. Logo, a ação do estado é fundamental para o modus operandi dos CAI (lima 2018.p, 130).

 

A política de subsídio da agricultura americana passou por várias mudanças ao longo da história. No passado, seu objetivo central era ‘incentivar os produtores a participarem de programas de controle de produção e redução de oferta’. Com as alterações, os subsídios estão cada vez mais ligados ‘exclusivamente’ ao apoio financeiro das fazendas. Além disso, essa política passou a ser um instrumento político importante para promover as exportações americanas, o que gera impactos significativos do ponto de vista internacional.

O subsídio da agricultura nos Estados Unidos ao longo da história sofreu críticas inclusive internamente. Segundo Lima (218.p, 145), ainda na década de 1980 o governo Regan tinha como um dos seus objetivos diminuir os gastos com as subvenções com esse programa agrícola, o que acabou perdendo forças na década de 1990 com as políticas protecionistas. Como já afirmado as exportações de commodities agrícola dos Estados Unidos acabou se tornando um fator positivo para a sua economia e o subsídio tornou-se fundamental para manter a tradição de grande exportador do mundo condição cada vez mais necessária para a sua balança comercial.

O forte peso econômico da agricultura americana, altamente subsidiada, sempre gerou muitas críticas nas reuniões das instituições que regulam a economia mundial. Segundo Lima (2018, p. 147), o debate revela duas dinâmicas: de um lado, a política de subsídios é considerada necessária para o funcionamento dos CAI (Complexos Agroindustriais) dos EUA, gerando o chamado ‘efeito multiplicador’ na economia interna; por outro lado, ela pode criar obstáculos à abertura dos mercados agrícolas internacionais.

O autor destaca, em determinado ponto do capítulo 5, que as instituições de controle vêm discutindo essa problemática ao longo da história. Ele também menciona que a tentativa de criação da Organização Internacional do Comércio (OIC) fracassou justamente porque os Estados Unidos não aprovaram, alegando que as regras da organização trariam empecilhos para sua política – entre os motivos estavam as cláusulas agrícolas, que não se ajustavam à arquitetura dos seus programas. No entanto, o que prevaleceu foram as políticas do GATT que foi criado para lidar com o movimento de liberalização da economia mundial.

Um fator importante e conclusivo apresentado na parte final do capítulo 5 (‘Regime alimentar internacional e o sistema multilateral de comércio’) é a capacidade dos Estados Unidos de ajustar o ambiente internacional às suas preferências domésticas. O autor argumenta que há uma profunda integração entre as políticas internas e internacionais, o que garante o funcionamento dos seus CAI (Complexos Agroindustriais), que são altamente subsidiados.

A ‘superprodução’ dos Estados Unidos, apesar de ser economicamente deficitária, exige subvenções financeiras às fazendas, o que gera problemas em relação à competitividade internacional, devido ao peso que a agricultura americana exerce no mercado global (grifo nosso).

Considerações finais

  • Conforme já mencionado, o livro de Thiago Lima, que foi lido e analisado, oferece importantes insights para aqueles que desejam se aprofundar no estudo das políticas de subsídios da agricultura americana. A obra é altamente recomendável, pois apresenta uma análise detalhada tanto da política protecionista agrícola dos Estados Unidos quanto dos seus efeitos na economia internacional. Alguns dos pontos conclusivos destacados no livro incluem:
  • A política de subsídios nos Estados Unidos é fortemente influenciada por um poderoso lobby político no legislativo, onde os interesses de um pequeno grupo prevalecem historicamente para garantir sua continuidade. O autor cita Tweeten (2002), que estimou que essa política beneficia apenas 0,2% da população americana.
  • Os agricultores americanos, em geral, ficam excluídos da dinâmica de obtenção de lucro em suas fazendas, o que frequentemente resulta em prejuízos financeiros. Esses déficits são compensados pela política de subsídios.
  • Em contrapartida, há um movimento que gera um efeito multiplicador na economia dos CAI, beneficiados pela superoferta que reduz os preços dos produtos, aumentando os lucros em setores além da agricultura. Isso cria, segundo o próprio autor, “um movimento de forças antagônicas: de um lado, o aumento dos custos totais de produção; de outro, o barateamento dos produtos.
  • Internamente, há um constante aumento dos custos de produção para os agricultores americanos, enquanto os preços baixos das commodities beneficiam os processadores dos CAI. No entanto, os preços dos alimentos processados para o consumidor final tendem a aumentar. O autor aponta um aumento de 122% no período de 1980 a 2008.
  • Por meio de seus CAI, os Estados Unidos conseguem manter sua “hierarquia de poder internacional”, permitindo-lhes “driblar os custos do ajuste doméstico, transferindo parte do problema para o exterior”. Essa política moldou o regime alimentar internacional, que absorve suas commodities subsidiadas.
  • O livro demonstra que a política de subsídios nos Estados Unidos é altamente concentrada e beneficia apenas uma pequena parcela das fazendas. Cerca de 60% das fazendas americanas não recebem subsídios, enquanto 10% das que recebem subvenções ficam com 75% do total desembolsado pelo governo.
  • O livro relata no seu capítulo 5 como os Estados Unidos moldaram a dinâmica do regime alimentar no mundo e assim conseguem colocar a sua super produção de commodities no mercado internacional. O modelo da sua política agrícola vem sofrendo críticas ao longo da história pelo fato de o aporte financeiro de subvenção direta a produção que cobre valor deficitário faz com que o preços das commodities utilizado pelo seu complexo agroindustrial que não exporta apenas commodities mas, também produtos manufaturados em um patamar privilegiado em termos de competitividade.

Referência bibliográfica utilizada

LIMA, Thiago. O protecionismo agrícola nos Estados Unidos: resiliência e economia política dos complexos agroindustriais. São Paulo: Unesp, 2018. ISBN 978-85-393-0711-1.

 

[1][1] Doutor em ciências política pela Unicamp – coordenador do grupo de pesquisa sobre a fome e relações internacionais (FomeRI).

[2] Segundo Lima (2018.p,53), apesar de os subsídios na agricultura americana representar um volume financeiro grande é apenas o 4º setor que mais recebe dispêndios federais. No acumulado de dados organizado pelo autor entre 1962 e 2012, mostra que o setor de defesa e programas militares consumiram 25,7% do total subsidiado. Os setores de saúde e serviços humanos consumiram 15,9%, tesouro (15,4%) e o setor agrícola consumiu 4,5% do total subsidiado no período analisado.

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